1 - As pessoas em primeiro lugar
Sempre considerei o termo "usuário" ruim por se referir também às pessoas que usam um sistema. Na maioria das vezes, usamos o termo para nos referir às pessoas que são dependentes de drogas.
Independentemente da maneira como tratamos as pessoas que usam nossos sistemas, é crucial compreender quem está por trás daquilo que projetamos. Afinal, não há como fazer um negócio sem as pessoas.
E, quando me refiro às pessoas, estou me referindo a todos os que estão envolvidos em um projeto, seja quem vai usufruir da solução final ou quem tem o desafio de atingir uma meta através de um serviço. O mesmo cuidado que devemos ter com os usuários dos nossos sistemas, devemos ter com aqueles que nos auxiliam a implementar as soluções.
É sempre importante ter algumas questões básicas na cabeça antes de começar a projetar um produto digital:
Pra quem estou projetando?
Porque vão usar?
Como vão usar?
Quem são as pessoas impactadas na empresa?
Como o projeto impacta a vida das pessoas?
Em 2016, trabalhei em um projeto para a Ipiranga que tinha como público-alvo principal caminhoneiros, frentistas e transportadoras. Naquele momento, o time tinha pouco conhecimento sobre público e tivemos que mergulhar para entender o comportamento dessas pessoas. Sem entender isso, não conseguiríamos resolver o problema da Ipiranga e do público. Este projeto mudou a minha visão sobre a importância de olhar para o comportamento de forma curiosa e sem viés.
2 - Não separe UX e UI
A separação entre UX e UI faz mal ao mercado de design, especialmente no Brasil. Obviamente, ainda há uma discussão pouco útil sobre a separação entre momentos importantes de desenvolvimento de produtos.
Na minha cabeça, uma pessoa designer deve ter fluência em atividades de UX e UI simultaneamente. As duas coisas caminham juntas o tempo todo. Eu entendo e respeito os pontos fortes de cada pessoa. Algumas lidam melhor com as atividades estruturais, enquanto outras resolvem a forma.
Podemos pensar um projeto em camadas de abstração, com início forte na formatação do problema e os principais frameworks de interação, mas sem se distanciar da camada estética que atrai as pessoas para o produto. O problema é quando trabalhamos com componentes estruturais sem pensar nos elementos visuais da interface.
No início da minha carreira, houve uma época em que o trabalho era bastante separado. Tinham as pessoas que cuidavam de pesquisa, arquitetura de informação e wireframes, e outras só da parte de visual design. Em muitos casos, as ideias não se encontravam devido à falta de integração entre a estrutura e a forma. As pessoas que tinham mais habilidades de visual design ignoravam o trabalho de UX porque os wireframes não tinham boas soluções de hierarquia e design de interação.
3 - O contexto importa mais que o tamanho da tela
Temos observado um comportamento interessante no Brasil devido às altas taxas de roubo de celular na região sudeste. As pessoas estão deixando de realizar transações financeiras, sobretudo na rua, por receio de serem assaltadas e perder o seu valioso dinheiro. Muitas pessoas deletam ou tentam esconder aplicativos de bancos quando estão na rua.
Portanto, quando planejamos nossos projetos, devemos levar em conta o contexto mais do que simplesmente se preocupar em criar uma experiência focada no desktop, celular ou tablet.
As pessoas usam as ferramentas de forma diferente. Elas dificilmente abrem o aplicativo de banco quando estão no escritório. Afinal, ninguém quer compartilhar seu saldo com os colegas de trabalho. Esse comportamento muda completamente quando as pessoas estão no conforto de suas casas.
Quando, onde, porque e como as pessoas acessam dados devem ser considerados antes de desenharmos qualquer experiência. Especialmente quando enfrentamos o desafio de pensar em algo multiplataforma. Quando uma ferramenta é criada com base no contexto, ao invés do dispositivo, ela é mais adequada e confortável para as pessoas.
4 - Pesquise somente o necessário
Se for necessário fazer pesquisas para tudo, não somos designers, mas pesquisadores. Nada contra quem se especializou em pesquisa. Quero deixar bem claro que acredito muito no poder da pesquisa, mas não podemos usar a pesquisa para qualquer tomada de decisão.
Este artigo, escrito pelo Nielsen Norman Group, mostra os tipos de pesquisa e quando devemos usar cada metodologia. Vale super a pena entender no detalhe os benefícios de cada escolha. Ele ajuda na tomada de decisão que precisamos fazer na correria do dia a dia.
Apesar de serem bastante benéficos, os métodos de pesquisa podem ser usados de forma incorreta e quando não é necessário. Já vi designers querendo testar coisas que deveriam estar no repertório das pessoas. Quantas interfaces de login já desenhamos? Será que não temos boas práticas? É realmente necessário validar algo que deveria estar bastante enraizado no repertório do designer?
Devemos ter bastante rigor e muito questionamento sobre as pesquisas que precisamos fazer. Muitas vezes, a informação está dentro de casa e com quem tem a chance de conversar com os clientes todos os dias.
Costumo usar o teste de usabilidade mais como aprendizado do que uma validação da minha verdade. Além de compreender se a pessoa consegue realizar facilmente uma tarefa simples, é possível captar diversos sentimentos sobre o produto e a marca.
5 - Aprenda com o mundo real
Estamos cercados por sistemas de navegação. Seja quando estamos em um shopping center, supermercado ou estação de metrô. Imagine se esses lugares não tivessem informações para nos orientar? Você já pensou em dirigir em São Paulo sem sinalização?
Brasília tem um bom sistema de navegação para localizar as ruas. Fico impressionado com a lógica e a facilidade de compreensão, mesmo para quem não mora na cidade.
Podemos aprender bastante observando exemplos do mundo real. Um aplicativo de banco ainda apresenta alguns conceitos semelhantes aos utilizados pelas agências para auxiliar os clientes a localizarem-se. Um e-commerce usa uma estrutura semelhante à que conhecemos quando vamos a um supermercado. A referência física ajuda e facilita o aprendizado das pessoas no digital.
Sempre que estamos em uma nova cidade ou local, temos a oportunidade de observar de forma atenta a estrutura para tentar compreender o que funciona de forma adequada e o que não deveria ser utilizado como exemplo.
6 - Aprenda com os exemplos ruins
Apesar de gostar de um aplicativo ou site, olho com atenção os problemas e o que posso aprender com eles. A ideia é tentar descobrir o que eu deveria evitar nos projetos que coloco na rua.
Existem algumas maneiras de analisar os problemas de uso de um produto, seja aquele de que você gosta ou até um serviço que seja concorrente ao seu.
Olhar atentamente os problemas de usabilidade de uma plataforma é a melhor maneira de não cometer os erros no seu projeto.
Quando realizo uma avaliação heurística de uma interface, procuro classificar os problemas em termos de gravidade baixa, média e alta. Dessa forma, consigo identificar problemas que preciso evitar na interface que estou projetando ou analisando do meu time.
Uma forma eficaz de identificar os problemas de usabilidade é estabelecer tarefas concretas e identificar as dificuldades durante o fluxo.
Quando trabalhei na Huge, por exemplo, tínhamos uma forma muito interessante e rápida de avaliar a qualidade das nossas interfaces. Os designers imprimiam a interface e colocavam em uma espécie de varal que ficava entre a copa e as mesas de trabalho. Dessa forma, quem passasse podia fazer alguma anotação sobre algo confuso na interface.
7 - Produtos atraentes passam a sensação de facilidade de uso
Em 1995, os japoneses Masaaki Kurosu e Kaori Kashimura, fizeram uma pesquisa para entender a relação entre usabilidade e a estética nas interações das pessoas com os computadores.
Eles entrevistaram 252 pessoas para avaliarem 20 interfaces de caixas eletrônicos usando a facilidade e a beleza.
Os resultados do estudo revelaram que as pessoas não julgaram problemas de usabilidade em relação ao funcionamento da interface. Elas julgaram com base na estética.
Não quero provar que uma interface linda resolve problemas de usabilidade. O pensamento aqui é o mesmo do princípio 2. Usabilidade e beleza são importantes para um produto ser de alta qualidade.
8 - Seja um bom detetive
Este princípio se conecta bastante com 4. O valor que geramos para um projeto é fazer as perguntas corretas e saber investigar de forma profunda a raiz do problema.
Muitas vezes as informações estão dentro de casa e os times já fizeram diversas pesquisas e geraram dados extremamente relevantes para o seu projeto. O segredo é juntar as informações e criar significado e ponto de vista.
Esteja preparado para conversar com as pessoas que vão usar o sistema ou que estão interessadas no negócio. Questione de forma genuína. Mostre interesse e curiosidade sobre a origem do problema. Não perca nada. Aprenda a perguntar ou procurar por alguma informação que já foi criada em algum lugar.
”We have to ask the right questions, read between the lines, follow the right hunches, and be good detectives.”
Universal Principles of UX - Irene Pereyra
9 - Feito é melhor do que perfeito
Pensar nas funcionalidades que o seu produto vai ter no início do projeto é fundamental e permite criar uma visão de evolução do produto de uma forma coerente.
Para colocar um produto na mão das pessoas, normalmente pensamos no mínimo viável. O que me preocupa é quando corremos o risco de cortar coisas que geram valor para as pessoas simplesmente pela velocidade de desenvolvimento, e esquecemos de questionar se o mínimo escolhido vai gerar valor real para as pessoas e o negócio.
Por isso, é importante ter clareza de onde um produto pode chegar em termos de funcionalidades e ser bastante criterioso com recortes que ainda geram valor, mesmo enxergando uma evolução.
10 - Times diversos criam melhores soluções
Pessoas com diferentes experiências enxergam a solução de um problema segundo a sua vivência. Quando pessoas diferentes se reúnem, os questionamentos e os pontos de vista são bastante diferentes e elas são capazes de questionar as dores e necessidades de diferentes perspectivas.
Uma pesquisa realizada pela McKinsey em 2015 com 366 empresas mostra que times diversos geram mais resultados financeiros para as empresas com base nas variadas óticas sobre a resolução de problemas.
É importante se cercar de pessoas diferentes de você. Como designers, estamos criando o mundo digital com base nas nossas perspectivas e experiências. Se o que colocamos no mundo for representativo, as chances de sucesso serão maiores.
O que estou lendo, vendo, ouvindo e observando
Universal Principles of UX - Irene Pereyra
Sempre fui fã do trabalho realizado pela dupla de designers Irene Pereyra e Anton. Este ano, Irene lançou um livro que mostra os 100 princípios de UX que ela acredita. Muitos dos princípios que tirei para este post foram inspirados no livro.
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Este livro traz estratégias para lidar com qualquer mudança de carreira. Desde uma estratégia dos seus primeiros 90 dias em uma nova empresa ou mesmo alguma mudança de cargo que apresenta novos desafios de aprendizado e adaptabilidade.
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Adoro estudar e entender o processo de trabalho de grandes mestres da nossa história. Neste livro, estou aprendendo como John McPhee transforma suas ideias e rascunhos em trabalhos de sucesso.
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A importância do olhar para o ofício como algo fundamental para criar e manter uma cultura de alta qualidade. O mundo ficou tão complexo que muitas vezes as pessoas se escondem em atividades complementares e esquecem de evoluir naquilo que é essencial para entregar um bom produto.